quinta-feira, 11 de junho de 2009

o velho pai.

O cenário é comum, a cena é singela. Num banco de jardim da casa estão sentados um homem idoso e um jovem. O jovem lê o jornal, com atenção. O idoso parece imerso em algo indefinível. Então, um pequeno pássaro pousa no arbusto próximo e canta. O homem parece despertar e indaga: O que é aquilo? – apontando com o dedo na direção da pequena ave. O rapaz alça os olhos e diz, secamente: É um pardal. A avezita saltita de um galho a outro e a pergunta se repete: O que é aquilo? A resposta agora não é somente seca, mas também denota enfado: Já disse, é um pardal! O pássaro voa do arbusto para a árvore, continuando na sua dança matinal. O que é aquilo? – soa de novo. Agora, o rapaz se irrita e quase grita: É um pardal! A ave, feliz, prossegue no seu bailar. Alça voo e parece desaparecer. Poucos segundos passados e retorna ao chão, bicando aqui, saltitando acolá. O homem leva a mão aos olhos, como se desejasse ajustar a visão embaçada e, com natural curiosidade, pergunta: O que é aquilo? O filho responde, em altos brados: É um pardal! Já disse: um pardal. E soletra, aos gritos: P - a – r - d – a – l. Você não entende? O homem se ergue, sobe os degraus, adentra a casa, lento e decidido. Pouco depois, retorna com um velho caderno nas mãos. A capa é bonita, denotando que foi guardado com cuidado, como se guardam preciosidades. Abre-o, procura algo, depois o entrega ao rapaz, ainda inquieto e raivoso. Leia! – ele pede. E acrescenta: Em voz alta! Há surpresa no moço, que lê pausada e cada vez com maior emoção: Hoje, meu filho caçula, que há uns dias completou 3 anos, estava sentado comigo, no parque, quando um pardal pousou na nossa frente. Meu filho me perguntou 21 vezes o que era aquilo e eu respondi em todas as 21 vezes que era um pardal. Eu o abracei todas as vezes que ele repetiu a pergunta, vez após vez, sem ficar bravo, sentindo afeição pelo meu inocente garotinho. Então, o filho olha o pai. Há culpa e dor em sua alma. Abraça-o, lacrimoso, beija-lhe a face, emoldurada pela barba por fazer. Estreita-o, puxando-o para perto de si. E assim ficam: um coração ouvindo outro coração. * * * Cenas como essa acontecem todos os dias, em milhares de lares, em todo o mundo. Nossos anciãos, de braços dados com Alzheimer, demência senil ou problemáticas outras, indagam, perguntam, questionam. A memória recente lhes falha. Mergulhados em retalhos de lembranças do passado, não entendem porque recebem gritos como resposta. Pensemos nisso! E se as lágrimas nos umedecerem os olhos, não tenhamos vergonha de abraçar com amor nosso velho pai, nossa mãe, vovó, vovô, madrinha, tia... Agora.

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